Integrada na Faixa Piritosa
Ibérica que, com cerca de 250 Km de extensão e uma largura que
chega a atingir os 40 Km, tem início no Vale do Sado e se
prolonga até ao Vale de Guadalquivir, próximo de Sevilha
(Espanha), a mina do Lousal
(situada na
freguesia de Azinheira dos Barros, concelho de Grândola,
distrito de Setúbal) foi explorada entre 1900 e 1988, data em
que foi dada como encerrada a sua actividade extractiva.
Foi um lavrador da região, António
Manuel, que, em Agosto de 1882, requereu ao Ministério das
Obras Públicas e Minas o diploma de descoberta do jazigo do
Lousal, que efectivamente foi registado em seu nome no ano
seguinte. A concessão provisória foi-lhe atribuída em 1885 e,
mais tarde, transmitida ao engenheiro de minas Alfredo Masson,
que a manteve até 1899 (data de alvará de abandono). Guilherme
Ferreira Pinto Basto foi quem obteve a nova concessão, em
1900. Novas concessões foram feitas, em 1904 (Lousal Novo) e
em 1922 (Lousal nº 2, Lousal nº 3, Sítio do Montado e Cerro
dos Arneirões). Entretanto, Guilherme Pinto Basto transmitira
o direito de exploração da mina à firma Minas dos Barros,
Lda., em 1910. Cinco anos mais tarde a concessão passava para
a empresa Henrique Burnay & Companhia e, em 1934, para a
Société Anonyme Belge des Mines d'Aljustrel. Durante dois anos
a exploração das duas minas foi feita pela mesma empresa que,
em 1936, passou à sociedade belga Mines et Industries S.A. a
exploração do Lousal.
Foi a partir precisamente da terceira década do nosso
século que o Lousal começou a ser explorado de forma mais
intensa, facto a que não é estranha a importância crescente,
do ponto de vista económico, das pirites cupríferas, em
virtude da procura do ácido sulfúrico. A SAPEC, que em 1928
começava a laborar em Setúbal com uma fábrica de
superfosfatos, pertencia ao mesmo grupo proprietário das minas
e era um dos consumidores internos das pirites do Lousal,
juntamente com a CUF (ainda que esta estivesse principalmente
ligada ao complexo mineiro de Aljustrel).
Foi entre os finais dos anos 50 e o início dos anos 60 que
se iniciaram estudos para a mecanização das minas do Lousal,
tendo havido contactos com as Minas de Montevechio, na
Sardenha, cujo chefe dos serviços mecanizados fora o inventor
dos protótipos de elementos-chave introduzidos nos trabalhos
de lavra do Lousal - as pás carregadores pneumáticas
autotransportadoras e os camiões pneumáticos
autotransportadores de entulhos ("dumpers")
(1).
O processo da
mecanização, praticamente concluído em 1962, foi acompanhado
da ligação das Minas do Lousal à rede rodoviária nacional,
cujos trabalhos foram executados por trabalhadores que, devido
à própria mecanização, haviam sido considerados "excedentes".
É também durante este período que se incrementam algumas
acções de carácter social, como a construção de habitações
para o pessoal das minas, casa de saúde, farmácia, posto
médico, instalações comerciais e salão de festas.
Se analisarmos os dados estatísticos referentes à população
do Lousal, de 1911 a 1960, assistiu-se ao seu acentuado
crescimento populacional (de 167 habitantes em 1911 para 1273
em 1940 e 1906 em 1960), iniciando-se a partir de então um
decréscimo da população residente, numa primeira fase
certamente ligado à mecanização do trabalho mineiro (1252
habitantes em 1970 e 957 em 1981) e, posteriormente, ao fecho
da mina (679 habitantes em 1991).
O território que acabámos de vos apresentar, após quase um
século de exploração mineira, é hoje uma zona degradada dos
pontos de vista ambiental e paisagístico, socialmente e
economicamente deficitária, marcada por restos da exploração e
em que são visíveis os estigmas que sempre são inevitáveis com
o abandono de projectos que sustentaram durante muito tempo e
em exclusivo o desenvolvimento local.
Felizmente que, no caso em apreço, menos de dez
anos após o encerramento, o antigo proprietário das
minas e o município local uniram esforços para promover no
Lousal uma iniciativa de desenvolvimento integrado, capaz de
reabilitar economicamente e socialmente a região e com uma
componente cultural.
A promoção e a
gestão do "Programa de Desenvolvimento lntegrado e de
Redinamizacão do Lousal" pertencem a uma fundação (Fundação
Frederic Velge) que congrega as duas instituições citadas. O
financiamento é parcialmente suportado por fundos
comunitários.
Para a realização da parte cultural foi convidada a
Associação Portuguesa de Arqueologia Industrial (APAI) que se
encarregou de desenvolver o "Projecto de Musealização da Mina
do Lousal".
Como acima dissemos, trata-se de um projecto de
desenvolvimento integrado que inclui a criação de
infraestruturas turísticas (hotelaria, espaços de lazer,
campismo, turismo rural, restaurantes) de formação
profissional e criação de micro-empresas e de equipamentos
culturais que em conexão com os restantes programas, assegurem
a sua quota-parte da viabilidade do projecto. Por essa razão,
a concepção e a implantação do programa museológico implicam
um diálogo constante com os promotores e a população, de modo
a garantir a qualidade do projecto e a salvaguarda dos
interesses de todas as partes. Também por essa razão o
programa tem de ser faseado, ao longo de alguns anos, ainda
que fosse mais aliciante a sua abertura ao público em
simultâneo e com a apresentação da totalidade do Museu
Mineiro.
Refira-se ainda que, uma vez assegurada a viabilidade do
projecto, trata-se de uma oportunidade única e pioneira no
nosso país de musealizar uma mina. De facto, nas últimas
décadas Portugal tem assistido ao encerramento sucessivo das
suas minas sem que jamais tenha sido possível mostrar ao
público o que é a actividade mineira (2).
O projecto do Lousal reúne
todas as potencialidades para tornar-se um verdadeiro pólo de
dinamização com três vertentes:
Cultural - graças à perservação e
reabilitação do património mineiro (nas suas componentes de
arqueologia e história mineira, de história geológica e de
arqueologia industrial);
Científica
- graças ao estudo e à divulgação que se pode fazer
desse património, nomeadamente através de um Centro de
Documentação/Arquivo a criar anexo ao Museu, e das publicações
do mesmo; e
Pedagógica - graças à
possibilidade que pela primeira vez se oferece ao público
português, nomadamente aos estudantes e outros interessados,
de tomar contacto com o universo das minas, da mineração e dos
Mineiros.
Tal projecto é então uma infraestrutura de carácter
sócio-cultural de que a região e o país carecem. E se
é certo que se trata de uma iniciativa de âmbito local não é
menos verdade que o alcance que terá excede em muito a região
do Lousal e diz respeito a todo o país.
A musealização de um espaço mineiro assume, pois, uma dupla
importância: para a população local, pela
oportunidade de redinamização sócio-económica e pela
reabilitação de um património sempre presente no quotidiano
dos habitantes e nas suas representações mentais, nomeadamente
afectivas; e para os visitantes que têm uma
apetência pelo universo mineiro, já pelo conhecimento dessa
realidade, já pela sedução por esse mundo desconhecido e
obscuro feito de mistérios em que tudo se passa nos
subterrâneos.
Sublinhe-se,
finalmente, que se pretende com este projecto contribuir para
o desenvolvimento social e cultural dos habitantes e dos
visitantes, para o enriquecimento económico do local,
corrigindo assimetrias, para um aumento progressivo do bem
estar pessoal e social e da qualidade de vida, isto é, para o
desenvolvimento integral e não apenas para o
crescimento económico.
NOTAS:
(1) Cf. SILVA, Artur Henrique Alegria Ferreira da - As
Minas do Lousal. Boletim de Minas. Lisboa: Direcção-Geral de
Minas e Serviços Geológicos. 5:3 (1968).
(2) Excepções são
uma pequena exposição/rnuseu numa antiga mina de ferro a céu
aberto em Moncorvo e uma exposição no local onde funcionou a
mina de carvão de S. Pedro da Cova.
[Sublinhados da responsabilidade da C.M.G.]